AGMP - Associação Goiana do Ministério Público -

Artigo: A festa do colarinho branco

07/06/2013

Artigo: A festa do colarinho branco
Confira o artigo sobre a PEC 37 do promotor de Justiça Paulo Rangel de Vieira, titular da 3ª Promotoria de Justiça de Goianira, publicado no jornal O Popular desta sexta-feira (7/6).
 
 
A festa do colarinho branco
 
Como é de conhecimento público, tramita na Câmara dos Deputados a Proposta de Emenda Constitucional nº 37 (PEC 37), batizada corretamente como PEC da Impunidade, cujo texto confere exclusividade às Polícias Civil e Federal para a investigação de crimes, o que é de todo indesejável para a sociedade brasileira, por vários motivos.
 
Um deles é que em apenas três países do mundo o Ministério Público não pode realizar a investigação criminal, sendo eles Quênia, Uganda e Indonésia! Não é preciso ser gênio para identificar o tremendo retrocesso democrático que a aprovação da PEC 37 representaria.
 
Ademais, chega a ser estúpido, e configura uma grande incoerência, estabelecer que a instituição responsável por promover a acusação (e prová-la) seja impedida de obter provas para fazê-lo!
 
Entretanto, para justificar a mencionada estupidez, os defensores da PEC 37 alegam que quando o Ministério Público conduz investigações criminais, há violação ao sistema acusatório (entendem que quem exerce a função de acusação não pode investigar porque perderia a imparcialidade), bem como ao princípio da paridade de armas entre acusação e defesa.
 
Nada mais falacioso!
 
Isso porque o sistema acusatório consiste apenas na separação das funções de acusar, defender e julgar. Portanto, a investigação criminal pode (se não deve) ser conduzida por quem tem a função de acusar.
 
Outrossim, o modelo de segurança pública vigente nos países mais democráticos prevê expressamente, há décadas (quiçá séculos), a realização da investigação criminal por parte do Ministério Público, conforme ocorre na Alemanha, Itália, França, Espanha, Estados Unidos, dentre outros. Em nenhum deles se cogitou da perda da imparcialidade por parte do membro do Ministério Público e tampouco da violação ao princípio da paridade de armas.
 
Não é por outro motivo que, no Brasil, o tema já está pacificado no Superior Tribunal de Justiça, consoante o Enunciado de Súmula nº 234, cujo teor é o seguinte: "A participação do membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia".
 
No mesmo sentido é o entendimento da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal que, por reiteradas vezes e de forma unânime, reconheceu o poder de investigação do Ministério Público na área criminal.
 
Outra falácia divulgada pelos defensores da PEC 37 consiste no argumento de que o Ministério Público seleciona os casos que quer investigar, o que é de todo falso.
 
Ora, o Ministério Público não pretende substituir as Polícias Civil e Federal, instituições que, ordinariamente, apuram a prática de infrações penais. As investigações do Ministério Público são necessárias justamente nos casos em que as referidas polícias encontram dificuldade em atuar, porquanto são subordinadas ao Poder Executivo, o que impede, por exemplo, a investigação de crimes contra a administração pública, notadamente quando os criminosos são aliados políticos de quem ocupa o poder.
 
Essa dificuldade ficou bem evidente na recente operação denominada PC 27, em que foram cumpridos mais de mil mandados de prisão expedidos contra pessoas investigadas pela Polícia Civil.
 
Apesar de a referida operação ter sido digna de aplausos, pois retirou um grande número de criminosos das ruas, não se tem notícia de nenhuma prisão ocorrida em razão de investigação por prática de corrupção, peculato ou outro crime considerado de "colarinho branco".
 
Em geral, ocorre exatamente o contrário nas investigações criminais conduzidas pelo Ministério Público. Em várias delas, as operações resultam em prisões, bloqueio de bens e condenações de criminosos que possuem notório poder econômico ou político.
 
Toda essa atuação eficiente de combate à corrupção e ao crime organizado cessará caso seja aprovada a PEC 37, uma vez que os grupos especializados em reprimir esses delitos existentes nos Ministérios Públicos Federal e dos Estados serão extintos, de maneira que a ingerência política nas polícias permitirá a prática de toda a sorte de crimes de colarinho branco, dentre outros graves delitos.
 
Urge salientar que outras instituições também ficarão impedidas de investigar, tais como a Receita Federal, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), a Controladoria-Geral da União e outras que, atualmente, cumprem bem suas funções.
 
Assim sendo e levando em consideração que o Brasil possui um dos maiores índices de corrupção e de outros tipos de criminalidade no mundo, fica a pergunta: é melhor reduzir ou ampliar o número de instituições legitimadas a realizar a investigação criminal?
 
A resposta a essa questão é evidente. A PEC 37 é, de fato, a PEC da Impunidade! Nos dizeres do ministro Joaquim Barbosa: "A sociedade brasileira não merece uma coisa dessas!"
 
Paulo Rangel de Vieira é promotor de Justiça, titular da 3ª Promotoria de Justiça de Goianira

Fonte: Jornal O Popular

Voltar
Associação Goiana do Ministério Público
Rua T-29, 1758 - St. Bueno.
Cep: 74.215-050, Goiânia - Goiás
Fone: (0xx62) 3285-6660
SAMP
Fone: (0xx62) 3274-3513
www.samp.org.br