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Artigo: O Supremo e a piada de salão

15/11/2013

Confira o artigo do promotor de Justiça Carlos Vinícius Alves Ribeiro, publicado no jornal O Popular desta sexta-feira (15/11).
 
 
O Supremo e a piada de salão
 
Em 2005, quando o escândalo do mensalão foi divulgado pela imprensa, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, agora já definitivamente condenado a 8 anos e 11 meses de reclusão, afirmou que em breve aquele escândalo se tornaria uma piada de salão.
 
Esta semana, em um dos capítulos finais do julgamento da Ação Penal Originária nº 470, o Supremo Tribunal Federal não apenas tratou de limpar o deboche do agora condenado, como demonstrou para a imprensa, inclusive internacional, que há juízes em terras tupiniquins.
 
O jornal The New York Times destacou que o braço direito do ex-presidente Lula, José Dirceu, foi condenado por corrupção e formação de quadrilha e iniciará o cumprimento dos seus 10 anos e 10 meses de condenação em regime fechado.
 
O britânico Financial Times captou bem o espírito do julgamento, classificando como um divisor de águas em um país onde os políticos e as elites são acusados de usar um sistema jurídico ineficiente para agir com impunidade.
 
Não foi diferente com o Le Monde, para quem três aliados de Lula foram julgados corruptos.
 
A boa nova correu o mundo.
 
O Brasil, que ostentava a imagem, não equivocada, de um país de grandes riquezas naturais, de enorme potencial, mas atolado em um lamaçal de corrupção, dá sinais, por meio de sua mais alta corte judicial, de que ainda que o sistema jurídico - confeccionado meticulosa e cuidadosamente por aqueles que temem um dia serem vítimas ura de piso, de que o pensamento de Sde sua própria criatura - não seja o adequado, é suficiente quando há vontade jurídica de todos os envolvidos no controle e na persecução penal.
 
Quando o Supremo Tribunal Federal decide, como ocorreu na quarta-feira, que dos 25 condenados, 23 iniciarão o cumprimento das penas que lhes foram impostas, ainda que pendente de discussão em agravo regimental, e melhor, 19 deles em regimes fechado e semiaberto, envia um recado à magistratólon, de 500 anos antes de Cristo, não pode mais vigir no século 21. As leis não podem ser teias de aranha que apanham os pequenos e são rasgadas pelos grandes.
 
A magistratura de primeiro grau, que, inicialmente, toca em questões ligadas à improbidade, recebe novo ânimo.
 
Desmistifica-se a ideia plantada, sabe-se lá por quais grupos, de que os órgãos jurisdicionais colegiados são mais complacentes com aspectos políticos, com a governabilidade, permitindo que questões e pressões alheias ao direito afastem ou amenizem a incidência de normas jurídicas.
 
O costume pode servir como valor de decisão, como já positivado no nosso sistema; mas apenas é lícito considerá-lo se lícito o próprio costume.
 
O costume com a corrupção, com a pessoalidade, com a imoralidade, com ações arbitrárias não é costume. Ao menos não no sentido técnico-jurídico. É patologia; e patologia passível de correção que imponha, como neste caso, a reafirmação das leis, que acabam sendo o mínimo ético exigível de todos e, com mais razão, de homens públicos.
 
Os que se submetem ao plexo de atribuições públicas são servidores. Exercem funções. E exercício de função não é mais que o dever de se desincumbir de todas as obrigações que lhe foram impostas pela norma que lhe atribuiu competência.
 
É dever de retidão ética, de atuação proba, de respeito aos limites impostos pela própria função.
 
A Ação Penal nº 470 é o primeiro passo rumo à Roma de 60 a.C., quando Júlio César condenou sua esposa, Pompeia, por ter gerado em Clódio o desejo de com ela se engraçar.
 
Assim como no fundamento da decisão de César, não basta ao homem público que seja honrado; é preciso que sequer seja suspeito. Mas esse julgamento apenas nós, o povo, somos legitimados a fazer.
 
Que venham agora as urnas...
 
Carlos Vinícius Alves Ribeiro é mestre e doutorando em Direito do Estado pela USP, professor de Direito Público na UFG e de Direito Administrativo na Escola Superior da Advocacia, e promotor de Justiça

 

Fonte: Jornal O Popular

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