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Artigo: PEC 37 aqui, caso Cahuzac na França

09/05/2013

Confira o artigo sobre a PEC 37 do procurador do Estado, Rafael Arruda Oliveira, publicado no jornal O Popular desta quinta-feira, 9 de maio.
 
 
PEC 37 aqui, caso Cahuzac na França
 
Nos meios jurídicos, e mesmo fora deles, em momento preocupante da epopeia nacional, toma corpo a discussão acerca da tentativa de redução (ou limitação?) dos poderes de investigação do Ministério Público em ações penais, o que, mentes lúcidas hão de convir, representará, em sendo aprovada pelo Congresso a malfadada PEC 37, um retrocesso sem precedentes na recente história constitucional brasileira. Ainda que algum excesso possa, eventualmente, haver na atividade de membros do Ministério Público, não é por meio da referida alteração constitucional que se vai obter uma pretensa correção na atividade ministerial. Fruto ou não de uma tentativa de certos setores políticos em promover retaliação aos atores (e autores) que conduziram ao resultado obtido com o julgamento decorrente da Ação Penal 470, apelidada de "escândalo do mensalão", fato é que o problema está na pauta do dia, não sendo aceitável que qualquer cidadão minimamente esclarecido alheie-se das discussões.
 
Nestas ocasiões, torna-se importante verificar os comportamentos que países altamente avançados adotam em situações que envolvem descalabro ao patrimônio público ou de falta de transparência com a coisa pública. Uma breve referência à França torna-se, neste sentido, de crucial importância. Além, é claro, de atualíssima. Veja-se o "caso Cahuzac".
 
Jérôme Cahuzac ocupava, até algumas semanas atrás, o posto de ministro das Finanças da França. Depois de ser inquirido publicamente durante seis meses e de negar exaustivamente, descobriu-se, afinal, aquilo que monsieur Cahuzac tanto insistira em contestar: a existência de alguns milhões de euros em bancos suíços. Como a Confederação Helvética não integra a União Europeia, encontra-se ela livre das obrigações relativas às trocas de informações com os países do grupo, notadamente em matéria de tributação de lucros e riquezas. Seja como for, o desvio de Cahuzac foi descoberto. Logo ele, um inveterado lutador contra as fraudes fiscais. O presidente francês, como não poderia deixar de ser, demitiu Cahuzac e, na sequência, deu início a uma série de medidas de "moralização", como por lá têm sido chamadas. Em busca de transparência no patrimônio de agentes da alta administração pública francesa, François Hollande determinou a todos os seus ministros a apresentação de relatórios públicos acerca dos respectivos patrimônios individuais, o que, aliás, já é praticado em grandes democracias, como EUA, Itália e Holanda.
 
A grande operação de transparência, reivindicação permanente em qualquer democracia, porém, não para por aqui. Idêntica medida pretende-se adotar para alcançar o patrimônio dos agentes públicos eleitos, o que, evidentemente, depende ainda de aprovação por parte do Parlamento francês. Além disso, ambiciona Hollande seja criado um parquet especial para a apuração de crimes fiscais. É isso mesmo: um Ministério Público especial com atribuição para apurar fraudes e crimes fiscais, em reforço à luta contra a corrupção.
 
Bem, já se percebe que esse paralelo com a França não foi feito por acaso. E ele foi elaborado para demonstrar que enquanto a França, país altamente avançado e civilizacional, adota medidas de recrudescimento a ilícitos penais que envolvem agentes públicos, inclusive por meio de uma tentativa de fortalecimento do seu órgão do Ministério Público, para tornar a corrupção mais arriscada, mais difícil e, portanto, mais rara, no Brasil, por outro lado, assiste-se ao contrário: à tentativa despudorada de fragilizar um dos mais vitais e importantes órgãos da democracia da terra "onde canta o sabiá". Brasileiros, vigilância!
 
Rafael Arruda Oliveira. mestre em Ciências Jurídico-Econômicas pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. É procurador do Estado

 

Fonte: Jornal O Popular

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